A relação
processual normalmente é composta pela relação entre autor, réu e juiz.
No entanto,
Dinamarco diz que essa relação triangular é apenas a configuração mínima. Nada
impede que se tenha uma configuração mais ampla. Nada impede que se tenha mais
de um autor e|ou mais de um réu, ou então que terceiros intervenham nessa
relação processual.
O fenômeno
da pluralidade de partes, portanto, é caracterizado por 2 fenômenos:
litisconsórcio e intervenção de terceiros.
O estudo do
litisconsórcio é dividido em 3 partes:
- Conceito
-
Classificação
- Dinâmica
do litisconsórcio
Conceito de litisconsórcio:
É o
fenômeno caracterizado pela presenta de mais de um autor, mais de um réu, ou
ambos, na formação da relação processual.
Classificação do litisconsórcio:
1) Quanto à posição na relação processual:
Ativo: mais
de um autor
Passivo:
mais de um réu
Misto: mais
de um autor e mais de um réu
2) Quanto à obrigatoriedade:
a) Litisconsórcio necessário:
É aquele
que é obrigatório ser formado na relação processual.
Ele deve
formar-se por 2 razões:
-> Por disposição de lei: a lei cria determinadas
hipóteses em que o litisconsórcio deve se formar obrigatoriamente (Ex: art 10
do CPC: precisa da presença do cônjuge em ações de direito real imobiliário e
nas ações possessórias nos casos de composse ou de atos por ambos praticados).
Ex: Ação de
reintegração de posse do autor em face do réu casado. Há litisconsórcio
necessário por disposição de lei, e o cônjuge do réu também deve estar no polo
passivo.
Ex2: Ação
de Usucapião de terras (Art 942 do CPC):
quando o possuidor de um imóvel pleiteia para si a propriedade do imóvel
que esbulhou, o réu será o proprietário, mas o autor deverá também
obrigatoriamente requerer a citação dos proprietários dos imóveis confinantes
(os imóveis vizinhos).
-> Pela natureza da relação jurídica discutida no
processo:
Existem determinadas
relações jurídicas que, por sua natureza, exigem a formação do litisconsórcio.
Quando o
processo discutir uma relação jurídica única, indivisível que não admite cisão,
incindível, todos os sujeitos dessa RJ têm que fazer parte do processo.
Ex: Ação de
anulação de casamento proposta pelo MP em face do marido e da mulher.
Esse
litisconsórcio é necessário, ainda que não haja nenhuma lei exigindo, pois a
relação jurídica discutida é o próprio casamento, logo deve haver a citação do
marido e da mulher.
Ex2:
Contrato de locação, em que há 2 locatários. O locador propõe uma ação
revisional de aluguel para aumentar o valor da locação em virtude da
valorização do imóvel. O locador necessariamente deverá requerer a citação dos
2 locatários, formando um litisconsórcio necessário, sem que haja disposição de
lei, pois a relação jurídica é incindível.
Se, nesses
casos, o autor ajuíza ação apenas em face de um dos réus, e não houver a
intervenção do terceiro, a sentença não irá atingir a outra parte que não foi
citada, pois ela não fez parte do devido processo legal, e a CF veda que alguém
seja privado dos seus bens sem o devido processo legal. A sentença não pode
produzir efeitos para fora do processo, e por isso exige-se a formação do
litisconsórcio necessário.
Ex: Ação
revisional proposta pelo locador em face de 1 locatário, sendo que havia outro
no imóvel. O locador deveria ajuizar contra os 2 (litisconsórcio necessário),
mas como só ajuizou contra 1, essa sentença não produzirá efeitos em relação ao
locatário que não citado, em respeito ao princípio do devido processo legal.
Qual a
consequência da não formação do litisconsórcio necessário?
Depende. Se
o juiz descobriu que faltava o litisconsórcio necessário antes da sentença, ele
deverá intimar o autor para que promova a citação de todos os litisconsórcios
necessários (art 47, par único do CPC). Se o autor não o fizer, o juiz irá
declarar a extinção do processo sem resolução de mérito por falta de condições
da ação, por falta de legitimidade das partes (Súmula 631 do STF, art 267, VI).
O supremo, no informativo 385, citou um único julgado que abriu um precedente
para a citação de ofício. Foi um caso isolado.
OBS:
Intervenção "iussu iudicis": É a possibilidade do juiz determinar a
citação, de ofício, de terceiros para integrarem a relação processual.
Esse fenômono está previsto no CPC italiano, mas NÃO é admitido no direito
brasileiro, pois estaria violando a inércia da jurisdição.
Se
descobriu que faltava o litisconsorte necessário só depois do trânsito em
julgado da sentença, a consequência será a não produção de efeitos para o
terceiro que não foi citado. Para as
partes (Ex: locador e locatário 1), como a relação jurídica é única e incindível,
essa sentença também deverá ser ineficaz, pois a sentença tem que ser única pra
todo mundo.
A
ineficácia da sentença transitada em julgado em processo em que não houve a
citação de todos os litisconsortes necessários é ABSOLUTA. Para que haja a
produçao de efeitos, deverá ser proposta uma nova ação.
É possível
a existência de litisconsórcio necessário ativo?
Ex: 2
locadores contra 1 locatário. Se os 2 locadores quiserem ajuizar, o litisconsórcio
ativo é facultativo e não tem problema.
Se 1 locador quiser propor a ação e o outro não, como faz? Obriga-se os 2 em
litisconsórcio ativo necessário? Um entra e o outro fica de fora?
Uma
corrente diz que o direito de ação é voluntário, e portanto não se poderia
obrigar o locador 2 que não quer a ser polo ativo.
Outra
corrente diz que a necessidade do litisconsórcio no povo ativo dá-se para
garantir o acesso à justiça da parte que quer entrar com a ação, uma vez que
aquela ação jurídica seria indivisível.
Súmula 406
do TST: entendeu o tribunal que só há litisconsórcio necessário passivo,
adotando a primeira corrente.
Nesse
sentido, o locador que não quer litigar não precisa ser litisconsorte.
Resp
1138103 -> O STJ entendeu, em 2011, no mesmo sentido.
No entanto,
como se resolve o problema do indivíduo que quer entrar com a ação?
O
entendimento é que se deve ajuizar a ação colocando o indivíduo que não quis
entrar com a ação no polo passivo, como réu.
Ex: O
locador 1 ajuiza ação contra o locatário e o locador 2, dizendo que este não
quis entrar com a ação. Faz sentido pois o locador 2 e o locatário querem a
mesma coisa: manter o valor do aluguel.
b) Litisconsórcio facultativo:
O
litisconsórcio facultativo, ativo ou passivo, ocorre nas hipóteses do artigo
46:
Art. 46.
Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto,
ativa ou passivamente, quando:
I - entre
elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide;
II - os
direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito;
III - entre
as causas houver conexão pelo objeto ou pela causa de pedir;
IV -
ocorrer afinidade de questões por um ponto comum de fato ou de direito.
O artigo
46, portanto, traz algumas hipóteses de cabimento do litisconsórcio
facultativo:
- Quando
houver comunhão de direitos entre as partes (Ex: 2 oficiais de justiça
contra o Estado do RJ pleiteando um mesmo benefício). => litisconsórcio no
polo ativo.
- Quando
houver comunhão de obrigações entre as partes (Ex: consumidor ajuíza
ação contra o fabricante e o revendedor). => litisconsórcio no polo passivo.
Nesses 2
casos, as partes estão formulando o
mesmo pedido.
- Quando os
direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito,
ou seja, quando houver a mesma causa de
pedir. (Ex: 2 pessoas pleiteiam reparação por danos materiais contra um
motorista que causou um acidente a elas; os pedidos, que provavelmente serão
diferentes, derivam do mesmo fato, que é o acidente).
- Quando
houver conexão pelo objeto -> mesmo pedido.
- Quando
houver conexão pela causa de pedir. -> mesma causa de pedir.
Essas 2
hipóteses lembram as 2 primeiras. Portanto, o inciso III = I + II.
- Quando
houver afinidade -> a causa de pedir
não é igual, mas semelhante. É a hipótese mais fraca de afinidade, pois nas
outras há o mesmo pedido ou a mesma causa de pedir.
Ex:3
fazendas que destinam-se à atividade da pecuária, mas o pasto bom está só em
uma delas, e os donos das outras fazendas ao lado começam a enviar o gado pra
fazenda do cara com o pasto bom. O gado de cada uma das outras fazendas
destruiu quantidade diferente de pastos da fazenda boa. O cara da fazenda com o
pasto 2 ajuíza ação contra os outros 2 fazendeiros que lhe prejudicaram. O
litisconsórcio aqui ocorre por um ponto comum de fato.
O objetivo
do litisconsórcio facultativo é proporcionar celeridade e economia processual.
O artigo
46, parágrafo único, traz a hipótese do litisconsórcio multitudinário:
Parágrafo
único. O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de
litigantes, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a
defesa. O pedido de limitação interrompe o prazo para resposta, que recomeça da
intimação da decisão.
O
litisconórcio multitudinário só vale para litisconsórcio facultativo! Não vale
para o necessário!
Ele ocorre
para impedir que uma "multidão" de litisconsortes acabem prejudicando
a celeridade e a economia do processo, indo justamente contra o objetivo do
litisconsórcio.
Não vale
para o necessário, pois ele é obrigatório pra todo mundo, ainda que isso gere
um grande número de litigantes.
O juiz irá
limitar esse litisconsórcio facultativo desmembrando esse processo em tantos
quantos forem necessários. A lei não diz um número máximo de autores; tudo
depende da análise do juiz no caso concreto.
Ex: ação
proposta por 100 autores em face do réu (desabamento em um estádio de futebol)
=> 100 torcedores X clube de futebol -> o clube terá 15 dias pra contestar
cada uma das 100 ações.
Se cada
autor poderá arrolar até 10 testemunhas, pode ter até 1000 testemunhas pra
serem ouvidas.
Diante da
prova pré-constituída em relação a todos os Impetrantes, pelo reconhecimento
administrativo, NÃO há que se falar em dificuldade carreada pelo número de
litisconsortes, pois a matéria é somente de adequação da lei ao fato, e
portanto não cabe o desmembramento.
Litisconsórcio
unitário: a decisão
no processo DEVE ser a mesma para todos os litisconsortes,
Litisconsórcio
simples: a decisão
PODE ser diferente para cada um dos litisconsortes. Ela pode ser igual ou
diferente.
Segundo o
que se desprende do artigo 47, todo litisconsórcio necessário é unitário, e a
decisão deveria ser a mesma para todos os litisconsortes. Essa presunção, no
entanto, é errada, ainda que de fato seja o que quase sempre acontece na
prática (exemplo do casamento e dos locatários).
No entanto,
como no caso de usucapião, a sentença dificilmente será a mesma para todos os proprietários. Para o
proprietário do imóvel usucapido, a sentença será "você perdeu o
móvel", e para os proprietários do imóvel vizinho, a sentença apenas
dirá o limite de suas propriedade.
Portanto,
nesse caso, o litisconsórcio é necessário e simples.
Litisconsórcio
originário:
É aquele se
forma no início do processo.
Litisconsórcio
ulterior:
É aquele
que se forma depois de instaurado o processo.
O
litisconsórcio ulterior é inconstitucional?
Alguns
argumentam que poderia violar o princípio do juiz natural, quando outras
pessoas entram no polo ativo após o sorteio e a distribuição.
Mas existem
casos em que não haveria discussão, quando por exemplo o autor morre e seus
dois herdeiros assumem o polo passivo, formando um litisconsórcio ulterior.
O Superior
Tribunal de Justiça entende que o litisconsórcio ulterior facultativo só é
cabível se houver expressa permissão legal.
Dinâmica do litisconsórcio:
1) Duplicidade
do prazo:
Os
litisconsortes com procuradores diferentes terão prazo em dobro para a
prática de todos os atos no processo.
OBS: Se for
o mesmo advogado não haverá prazo em dobro, e esse advogado poderá fazer carga
dos autos.
Questão:
Quando só
um litisconsorte vai recorrer, ele terá prazo em dobro?
O
entendimento é de que não
Súmula 641
do STF: não se conta em cobro o prazo para recorrer quando apenas um dos
litisconsortes haja sucumbido.
Se um dos
réus não contesta e é decretada a revelia, haverá prazo em dobro para o outro
litisconsorte para a prática dos demais atos processuais?
O STJ
entendeu que não, pois embora tenha 2 réus, apenas 1 deles estará praticando
atos processuais.
2) Independência
dos litisconsortes:
Os atos e
as omissões de um não prejudicarão nem beneficiarão os outros, salvo disposição
em contrário. Eles serão considerados litigantes distintos.
Exceção:
atos que, quando praticados por um litisconsorte, atingem o outro.
Para tal, a
doutrina criou a teoria das condutas determinantes e das condutas alternativas.
Conduta determinante: a parte está
pedindo para si algo que lhe seja desfavorável, e nesse caso o juiz precisa
conceder (Ex: renúncia ao direito, desistencia da ação, confissão etc).
Conduta alterativa: a parte está pedindo
algo que lhe seja favorável, e o juiz pode dar ou não (Ex: quando contesta,
quando recorre, quando pede a procedência do pedido como autor, quando pede a
improcedência quando é réu etc).
Quando um
litisconsorte praticar conduta determinante seu ato jamais atingirá o outro
litisconsorte (Ex: se renuncia ao direito, renuncia sozinho; se confessa,
confessa sozinho, não vale pro outro).
Quando um
dos litisconsortes praticar conduta alternativa, aí depende. O ato atingirá os
demais litisconsortes se tiverem o mesmo interesse. O ato não atingirá os
demais se os interesses forem distintos.
Ex1: art
509 do CPC -> se o réu 1 apela e o réu 2 não apela, a apelação do réu 1
aproveitará o réu 2 se eles tiverem o mesmo interesse. Se os seus interesses
forem opostos, a apelação de um não aproveitará o outro réu.
Ex2: art
320, I do CPC -> diz que não haverá presunção de veracidade decorrente da
revelia se de dois ou mais réus, um deles contestar. Mas se os seus interesses
forem distintos, esse efeito não se verificará.
OBS: A
confissão no litisconsórcio simples só produz efeitos para a parte que
confessou. No litisconsórcio necessário ela é tida como ineficaz.
Litisconsórcio eventual:
Cândido
Dinamarco chama de litisconsórcio alternativo ou eventual aquele em que o
autor, "estando em dúvida razoável sobre a identificação do sujeito
legitimado passivamente, tem a faculdade de incluir dois ou mais réus em sua
demanda, com o pedido de que a sentença se enderece a um ou outro conforme
venha a resultar da instrução do processo e da convicção do juiz". Aponta
como exemplo a ação de consignação em pagamento por dúvida quanto à
titularidade do crédito.
Segundo
Fredie Didier Jr, “no litisconsórcio eventual a procedência de um pedido
implica a improcedência do outro".
Ex: Ação de consignação em pagamento por dúvida
quanto à titularidade do crédito.
Ex2: Mãe,
em ação de investigação de paternidade, quando não sabe quem é o pai do bebê.