Tal teoria tem origem na jurisprudência da Suprema Corte
norte-americana, tendo sido criada para situações em que o agente finge não
enxergar a ilicitude patente de um determinado fato, com o intuito de
beneficiar-se. Assim, em curiosa
analogia, o agente comporta-se como uma avestruz, enterrando sua cabeça na
terra para não tomar conhecimento da natureza ou extensão do ilícito praticado.
Em outras palavras, o agente finge-se “de bobo”,
incorrendo em dolo eventual, pois prevê o resultado lesivo de sua conduta, não
se importando com o seu resultado. Dessa forma, para boa parte da doutrina que
aborda o assunto, não poderia tal teoria ser aplicada em caso de crimes
culposos, sob pena de configuração de responsabilidade penal objetiva, a qual
deve ser rechaçada no direito penal brasileiro. A aplicação da “teoria da
cegueira deliberada” exige a demonstração do dolo na conduta, ainda que
eventual.
O tema está em voga por ter sido relacionado ao
julgamento do Mensalão (Ação Penal 470), e tem sido utilizado por nossos
tribunais em crimes de receptação qualificada, transporte de substâncias e
lavagem de dinheiro. Veja um julgado de 2013 que extraímos do TRF da 4ª Região:
PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL
DE DROGAS E ARMAS. TRANSNACIONALIDADE. QUANTIDADE DE DROGAS. CEGUEIRA
DELIBERADA.
(..,) 4. Age dolosamente não
só o agente que quer o resultado delitivo, mas também quem assume o risco de
produzi-lo (art. 18, I, do Código Penal Decreto-lei no 2.848, de 7 de dezembro
de 1940. Código Penal - Decreto Lei 2848/40). Motorista de veículo que
transporta drogas, arma e munição não exclui a sua responsabilidade criminal
escolhendo permanecer ignorante quanto ao objeto da carga, quando tinha
condições de aprofundar o seu conhecimento. Repetindo precedente do Supremo
Tribunal Espanhol (STS 33/2005), "quem, podendo e devendo conhecer, a
natureza do ato ou da colaboração que lhe é solicitada, se mantém em situação
de não querer saber, mas, não obstante, presta a sua colaboração, se faz
devedor das consequências penais que derivam de sua atuação antijurídica".
Doutrina da cegueira deliberada
equiparável ao dolo eventual e aplicável a crimes de transporte de
substâncias ou de produtos ilícitos e de lavagem de dinheiro.
(TRF-4 - ACR: 50002204120134047005 PR
5000220-41.2013.404.7005, Relator: JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, Data de Julgamento:
20/11/2013, OITAVA TURMA, Data de Publicação: D.E. 22/11/2013)